quinta-feira, 23 de junho de 2011

Marianne - Parte II

Carlos acordou e percebeu algo estranho... Já não era mais ele quem narrava esta história. Era eu. Marianne. E eu me sentia estranha, ou sei lá, talvez um pouco diferente por ter feito tudo o que fiz. Foi muito bom ter encontrado Carlos, mas... será que eu precisava ter transado com ele? Meu Deus, onde eu estava com a cabeça? Ele tem 46 anos e eu estou prestes a fazer 18. ele poderia ser meu pai, ou bem um tio, como ele é para Rachel. E nós poderíamos ter nos dado bem sem sentir atração um pelo outro. Será?
Me levantei cedo e dei de cara com Ana na cozinha.
- Você deve ser a menina que o Seu carlos me falou. Bom dia.
- Bom dia! Rachel está aí. Você sabe que horas ela acorda?
- Essa menina é uma desviada... acorda quando quer, come quando acha que é bom. Vive esperando um tal de Lucas que nunca telefona. Está sempre no mundo da lua.
- Hum... eu já fui como ela.
- Imagino. As mulheres que o Carlos traz pra cá não são muito diferentes. Todas mais parecem suas pacientes do que amantes. Até a irmã e a sobrinha são iguais. Acho que ele nasceu para isso.
Ana era uma mulata muito bonita. Cabelos longos e cacheados, presos a uma borrachinha de cabelo azul celeste. Ela me parecia um pouco arrogante, porém sua beleza era tanta que a arrogância era indiferente. Eu me sentia envergonhada perto dela, não sei porquê.
- Você está bem?
- Estou sim. Acho que vou dormir mais um pouco. Carlos te avisou que vou ficar aqui por algum tempo?
- Disse. E disse que não sabia o que fazer com você. Se achasse bom, era pra eu te dar umas palmadas.
- Está bem - disse eu, com uma risada divertida. - Se precisar de ajuda, me chame, por favor! Não quero encomodar.
Peguei o colchão que estava atrás do guarda-roupa de Carlos e botei ao lado da cama de Rachel. Demorei um pouco para voltar a dormir. Ouvi a voz de Carlos na sala, conversando com Ana. ela soltava umas risadinhas e ele dizia coisas que eu não conseguia entender. Senti um pouco de ciúmes ao pensar nela como amante daquele com que eu havia feito sexo na noite passada. Mas como eu sabia que ele não era nada além de um bom amigo, dormi. Acordei com o meu celular tocando.
- Alô?
- Minha filha! Que bom que te encontrei! Onde você está?
- Não interessa. Mas estou bem longe de casa.
- Por que você faz isso comigo? Você sabe que eu também sinto falta de seu pai e...
- Mãe, sei que você só me ligou porque sua amiga deve ter lhe dito algo que pesou na sua consciência e porque eu sei que este horário o Gui não está em casa. Por favor mãe, eu não queria magoá-la, mas você faz o favor de me ligar sabendo que não quero ouvi-la. Pela última vez: me deixe. Quando eu for uma profissional excelente e tirar fotos incríveis, me chame para fotografar o casamento do teu filho perfeito.
Desliguei o telefone sem ouvir a resposta que ela me daria. Se é que me daria alguma resposta. Minha mãe tinha a mente vazia, fazia tudo para agradar os outros, e eu não suportava isso. Queria que ela fosse mais compreensível, inteligente e menos submissa. Ó mamãe... quem me dera se você fosse diferente.
Rachel entrou no quarto e eu estava só de camiseta. Ela perguntou o que havia acontecido, eu falei que minha mãe havia me ligado. Ela me deu um abraço e se sentou na cama. Pegou na mochila um pequeno pacote e um tubo vazio de caneta esferográfica. Me convidou para entrar no mundo dela. Eu sempre soube que havia drogas no meio disso tudo.
Cheiramos umas 20g de pó, só para esquecermos os problemas que estavam ao nosso redor. Ela era uma guriazinha bonita, porém trilhava o mesmo caminho que eu. Não dava dois anos para ela estar na casa de um estranho que a ajudou pois sentiu pena da mocinha bonitinha e transar com ele depois de contar sua história triste. Eu não queria mais aquilo pra mim e, na minha viajem, eu era Greta Garbo.
Rachel compreendia o meu feeling e isso tudo era lindo. Eu sabia que ela também escondia o seu medo em um pacotinho dentro da mochila, sempre olhando em volta para ver se a polícia não vai pará-la e levá-la para a prisão.
- E esse Lucas, quem é?
- Um cara que eu transei em troca umas gramas de pó.
- Você entrou mais cedo do que eu nessa vida, guria. Sai dela enquanto dá tempo.
- Por que você não saiu ainda?
- Porque ainda não chegou a minha vez. Mas a sua está por vir. Nunca deixe esses traficantezinhos encostarem em ti. Fui dar uma de esperta e apanhei até ficar inconsciente. Foi aí que o seu tio me achou, jogada na rua. Sério Rachel, tu és linda, tem dinheiro e pode ficar com quem tu quiser. Tem um tio maravilhoso e não é todo mundo que tem a alma igual a dele. Você pode morrer se ninguém te ajudar. Escuta o que eu estou te falando... não deixe sua vez chegar.
Ela me olhou com olhos grandes de quem ainda estava muito chapada e sorriu. Cheirou outra carreirinha. Deitou no meu colo e disse "Obrigada, Marianne. Talvez esta seja a última vez que nós duas vamos nos drogar".
Fiquei atenta, observando ela se mexer loucamente na cama, efeito da droga. Fui até a cozinha e fiz um chá. Ela bebeu na maior fissura, como se aquilo fosse deixá-la pior. Rachel era incrivelmente engraçada e Ana percebeu o que estava acontecendo.
- Marianne, você também...?
- Não diga pro Carlos, por favor. Nunca mais farei isso. Não aqui na casa dele.
Ana me olhou desconfiada e ouvia Rachel rir com um quê de preocupação. Liguei o rádio e botei Bob Dylan pra tocar. Nós duas cantamos "Like a Rolling Stone" como se o mundo fosse acabar naquele instante. Eu era mais sóbria e mais resistente do que ela. Era capaz de Carlos chegar e perceber que havíamos feito besteira.
- Olá meninas! Dá pra ouvir lá de baixo o som de Bob Dylan.
- Oi tio Carlos!!! - Rachel estava eufórica e deu um abraçado no tio. - Achei que você fosse demorar mais um tempinho.
- Saí mais cedo hoje. Estava pensando em levá-las para jantar. Você gosta de comida mexicana, Marianne?
- Gosto sim Carlos. Obrigada por tudo!
- Não precisa agradecer. Depois temos que conversar.
- Acho melhor não, Carlos. Deixe tudo como está, assim nós podemos ter nossa mente tranquila e sem receios.
Carlos me olhou pensativo e sorriu para Rachel. Ele foi tomar um banho e depois foi se arrumar. Lá pelas 20h, estavámos saindo.
Ele estava charmoso como nunca. Colocou uma calça jeans, uma camiseta social e um paletó de risca de giz. Rachel estava de vestido, preto, uma jaqueta de couro e tênis all star. Eu me sentia envergonhada por não ter roupas que prestassem, porém rachel me emprestou uma blusa, um tanto quanto decotada para meninas da idade dela e vesti uma calça jeans, normal. Se Carlos estivesse narrando, essa parte estaria de fora. Homens não se importam muito com o quê você está vestindo.
Chegando ao restaurante, tive uma surpresa muito, mas muito intrigante. Meu irmão sempre disse que tinha uma namorada e que tinha planos de casar-se com ela. Nunca imaginei que esta namorada fosse Ana. E eles estavam lá, com minha mãe e mais uma senhora que deveria ser a mãe dela. Carlos não hesitou em ir cumprimentá-la.
- Ana, que prazer em vê-la aqui!
- Oi Carlos! Não imaginava que vocês estariam vindo para o mesmo restaurante que eu! Este aqui é o meu namorado Guilherme, a mãe dele e a minha mãe. Gui, este é o meu chefe, o Seu Carlos!
- Tudo bom? Ana sempre fala muito bem de você.
- Tudo ótimo. Por que não nos juntamos? Vocês vão adorar saber a minha história! Marianne, Rachel, venham até aqui.
Olhei para Rachel e ela não entendeu. Queria dizer que não queria ir, mas não podia pensar em abrir minha boca, minha mãe reconheceria minha voz na hora. Corri para o banheiro. Rachel veio atrás de mim.
- O que foi? Por que você está assim?
- Lembra que te falei da minha mãe e do meu irmão mais velho?
- Sim, mas o que tem?
- O namorado da Ana é o meu irmão.
- Guriaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa!!! Não acredito! E agora? Neste instante o meu tio deve estar contando que você é moça que ele ajudou e blá blá blá. Na certa eles vão saber que é você!
- Pois é... o jeito é encarar a situação e minha mãe descobrir tudo.
Criei coragem, peguei na mão de Rachel, olhei fundo nos olhos dela e saímos do banheiro. No que eu estava chegando na mesa, algo aconteceu...

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Marianne - Parte I

Nunca havia visto coisa tão estranha. 46 anos de vida e eu nunca havia visto moça tão acabada. Era linda, olhos cor de mel, pele branca e alva, cabelos castanhos, emaranhados. Porém parecia ter levado uma surra, ou algo parecido. Estava jogada no chão, desacordada, sangue ao redor dos lábios e alguns hematomas em seus braços e rosto. Mesmo assim, continuo a dizer que ela era linda.
Carregava uma mochila e estava bem vestida. Só o seu rosto denunciava algo de errado. Estava muito machucada. Tomei coragem e me aproximei, para ver se ela estava viva. Não se mexeu, mas senti sua respiração, fraca. Peguei-a nos braços e levei-a até o hospital mais próximo.
- Bom dia. Encontrei essa moça aqui perto, ela está desacordada e muito machucada.
- Certo. Qual o nome dela?
- Não faço a menor ideia. Talvez tenha algum documento aqui, para que possamos fazer a ficha dela. - preocupado e com rapidez, procurei em sua mochila algo que a identificasse. - Aqui está, senhora.
A atendente do Hospital de Pronto Socorro fez a ficha da moça e chamou os enfermeiros. Auxiliei-os e ela foi levada até o leito emergencial. Aproveitei meu dia de folga para passar ao lado daquela moça, que era tão bela e eu não fazia a menor ideia de quem ela seria. Algumas horas se passaram até que ela acordasse. Eu estava lá, olhando para ela com um olhar curioso.
- Quem é o senhor? Onde eu estou?
- Olá. Encontrei você na rua, estava muito machucada. Você está no Pronto Socorro e, não se preocupe, para o que precisar, estarei aqui.
- Obrigada, mas eu não sei o seu nome. Como posso confiar no senhor?
- Eu também não sabia o seu, mas tenho certeza que não posso confiar em você. É por isso que estou lhe ajudando.
Ela sorriu e chamou a enfermeira. Teve uma refeição e, após algumas horas, foi liberada. Mas isso já era tarde da noite. Acompanhei-a até a Lancheria do Parque e ofereci um sanduíche. Ela aceitou. Começamos um diálogo desconfiado, até que o mesmo virou uma boa conversa entre velhos amigos.
- Meu nome é Marianne. Que nem a Marianne Faithfull, sabe? Meu pai adorava ela.
- Nossa, eu adoro ela também. Linda e com uma bela voz. Meu nome é Carlos. Que nem... eu mesmo. Na verdade nem sei porquê, mas é isso. Me chamo Carlos.
- Carlos... interessante. Por que tu me ajudaste? Ninguém hoje em dia liga muito para jovens jogadas no chão.
- Pois é, o problema é que te achei muito bonita e precisava fazer algo. Não tinha a menor ideia de quem você era e nem como ajudá-la. Minha preocupação maior era saber se você estava viva. Um desperdí­cio deixar uma moça tão bela morrer.
- Então você tinha segundas intenções comigo, não é? Sabia! sabia que você não era diferente. Me salvou para ter um simples momento de gozo, não é?
- Talvez. Mas agora não penso nisso. Você me parece muito nova.
- Ahhh, pois saiba que eu tenho 17 anos. Devo parecer muito mais velha, estou acabada. Faço 18 semana que vem.
- Meus parabéns, se eu não voltar a vê-la. Tenho 46 anos. Sou escritor.
- Meu sonho é ser fotógrafa. Minha mãe não suporta isso. O sonho dela é me ver com um jaleco branco... atendendo em hospitais, é claro, nunca revelando fotos. É por isso que fugi de casa. Nós estávamos sempre brigando, principalmente após a morte do meu pai. Ele morreu mês passado. Ela ficou muito triste e sempre me pressionando, pois acabei a escola ano passado e não faço vestibular porque ela não quer financiar o que EU quero, e sim o que ELA quer para mim. É triste, sabe, meu pai sempre me apoiava em tudo o que eu fazia e tava sendo bem difí­cil morar apenas com ela.
- Então você está fugindo... Acho melhor devolvê-la.
- Não! Se você quer me ajudar, jamais pense nisso! Ela não me ama como filha, faz questão de dizer que sou um desgosto, só porque sou drogada e bêbada.
- Sabia que havia drogas no meio dessa história. Você estava drogada quando te encontrei?
- Não, acho que estava em coma alcoolico. Bebi demais e não comia há 3 dias. Ainda fui até a casa de um ex-namorado meu, que não é boa gente. Ele me bateu. Não importa porquê. Mas foi isso mesmo, estou numa pior. Procuro por um emprego e um lugar para morar.
- Acho que nesse caso posso te ajudar. Moro sozinho em um apartamento grande, ali na 24 de Outubro. Você pode ficar lá por alguns dias, até que tome jeito em sua vida. E posso te arranjar um emprego onde eu trabalho, como secretária ou algo do genêro, pode ser?
- Pode sim! Nossa, muito obrigada!!!
- Antes que eu me esqueça, tome sua mochila. Todas suas coisas estão aí­. Agora vamos para casa, amanhã eu trabalho.
Foi de boa vontade que ela veio para minha casa. Fomos caminhando até lá, afinal, não era muito longe. Mas foi uma boa caminhada, e nós conversamos bastante.
- Chegamos.
- É aqui que você mora??? Nossa, que lugar incrível!!!
- É, dá pro gasto. Tem uma moça, minha empregada, ela vem aqui todas as terças, quartas e quintas-feiras. Só para vocês não se estranharem já vou avisando.
- Está certo... se quiser dispensá-la, tudo bem! Posso fazer o serviço de casa para você, já que está me ajudando. Não me importo!
- Não precisa! Até que se recupere desses cortes no rosto, quero que a Ana te ajude e te mime bastante.
- Hahaha, você é quem manda, Carlos. Estou bem. Nem precisava se preocupar tanto!
- Que nada mocinha. Venha, vou te levar até seu quarto.
Meu apartamento tinha três quartos. O meu, que era o maior, o que eu fazia de escritório, onde ninguém entrava e o menor, que era o de hóspedes, onde Marianne ficaria. Era ajeitadinho (às vezes minha sobrinha dormia por lá e Ana fazia questão de arrumá-lo). Muito aconchegante, tinha uma vista linda para o céu. Eu sabia que ela adoraria ficar naquele quarto pequeno.
- É um pouco pequeno, mas...
- Muito Obrigada, Carlos. Obrigada mesmo! - ela me interrompeu. - É lindo! Acho que vou pensar duas vezes antes de arranjar um lugar para eu ficar, haha!
- Pois bem, fique o tempo que achar necessário. Ah, tenho uma sobrinha que é uns dois anos mais nova que você, às vezes ela vem passar uns dias aqui. Ela costuma dormir neste quarto, se caso ela aparecer, divida-o com ela. Acho que vocês vão se dar bem. Ela também gosta de fugir da mãe e vir pra cá, ver o céu através dessa janela que parece ser maior que o próprio quarto.
- Tudo bem, se tu dizes... espero não atrapalhar.
Ofereci à ela uma toalha e disse que ela poderia tomar banho, se quisesse. Ela foi, e eu fiquei ouvindo sua voz, fina e desafinada, cantando uma música dos Stones. Era a minha favorita deles. Por alguns segundos imaginei-me com ela, possuindo-a, enquanto a ouvia cantar. Senti nojo e voltei à realidade. Entrei em meu escritório e lá eu comecei a escrever uma crônica sobre ajudar as pessoas, contando também o fato que me havia ocorrido. Espero que ela seja publicada em breve.
Ela saiu do banho e me chamou. Fui até a sala e a vi, seminua. Estava linda como nunca, a luz branca do poste na rua iluminava a janela, mostrando sua pele que era mais branca ainda e, sim, eu podia ver a silhueta perfeita daquela jovem, seus traços, ainda de menina, e seu jeito sedutor de mulher.
Ao me ver, ela se cobriu com a toalha, murmurei desculpas e perguntei o que ela queria.
- Bom, eu... gostaria de saber se você tem um pouco de mel por aqui.
- Tenho, ali no armário da cozinha.
- Ah, obrigada. Eu gosto de comer mel antes de dormir.
Ela sorriu, sem graça, seus olhos procuravam uma saída para algum lugar. Ofereci à ela um cigarro, ela aceitou. Nos sentamos ao sofá, ela comendo mel e eu tomando um café extremamente forte. Fumávamos. Já passava das 3.
- É lindo isso aqui. Você é muito gentil, mas ainda não confio em ti.
- Eu também não confio. Você pode ser uma biscate que tem um namorado psicopata e pode me matar e roubar a casa inteira.
Ela deu algumas gargalhadas e descontraiu aquele ambiente de desconfiança e cinzas do bom e velho Camel. Peguei em sua mão. Ela se assustou e olhou bem nos meus olhos. Pude ver que seus olhos, sob a luz branca, tinham um brilho acinzentado. Ficou séria e me olhava como quem dizia "não, Carlos, isso é invenção de sua mente de escritor". É, ela estava certa. Apaguei o cigarro, me levantei. Murmurei boa noite e ela ficou estática no sofá.
Fui para meu quarto e a última coisa que fiz foi dormir. Pansava constantemente naquela moça que simplesmente havia me conquistado. Pensava em mim como um criminoso, abrigando uma menor de idade que está fugindo da mãe e largada no mundo das drogas. Ela tinha cocaína na mochila e eu, como bom crimonoso que sou, não joguei fora. Por outro lado, pensava em mim como um homem disposto a ajudar o próximo e que não havia problema, já que ela estava prestes a fazer 18 anos e saía de casa por causa de desavenças com a mãe. Foi uma noite contestadora.
Me acordei às 11 da manhã, como de costume, porém algo estava diferente. Não era terça, nem quarta, nem quinta-feira e mesa do café da manhã estava posta. Estranhei, porém minha mente se lembrava que uma moça belíssima estava em minha casa. Marianne havia preparado torradas e um café preto BEM forte. Me recebeu com um largo sorriso e um bom dia espetacular.
- Já vai trabalhar?
- Sim. Falarei de você para eles lá. Está mesmo disposta a trabalhar?
- Estou sim. Não importa a burocracia. Preciso de dinheiro.
- Sabe que estou aqui para te bancar, não é?
- Hahaha, mas não vai querer compras drogas pra mim, não é? Não vai querer me levar à festas? Não vai querer pagar todo álcool que consumo, não é mesmo?
- De fato. A não ser que você queira dividir esse seu vício comigo.
- Eu não quero que uma pessoa com um bom emprego e uma boa conduta seja prejudicada por uma drogada que não se conforma com a morte do pai e foge de casa para não ver a mãe.
- Sua mãe deve estar preocupada. Você é filha única?
- Dela não. Eu tenho um irmão mais velho. Ele faz a cabeça da minha mãe e diz que eu não presto, eu isso e eu aquilo. Ela pode até se preocupar, mas certamente meu irmão está lá, dizendo coisas que, em parte, são verdade.
- Hum. E você? Como se sente sobre isso?
- Neutra. Nunca fui muito apegada à minha mãe, pelo fato de ela gostar demais do meu irmão, que é todo certinho, o senhor boas notas, exemplo do colégio e etc. Queria aprender a gostar dela, mas não consigo. Meu pai é quem era a minha paixão. Antes dele, o meu avô. Mas ah, todos se foram antes que eu pudesse dizer algo que me beneficiasse.
- Marianne, eu tenho que sair. Tenha um bom dia. Se o telefone tocar, anote todos os recados.
- Ok senhor escritor! =D Bom trabalho!
E ela ficou lá. Lendo, ouvindo música, fumando, escrevendo, anotando meus recados. Era como se um anjo tivesse caído nos meus braços. Um anjo não tão puro, mas belo e significante.
- Alô?
- Sim, quem fala?
- Ahhh... é da casa do Tio Carlos?
- Sim, sim, aqui é a Marianne! Você deve ser a sobrinha dele, não é?
- É... e você, quem é? Empregada nova?
- Hmmm, não. Pelo visto seu tio tem um apreço muito grande por essa tal de Ana. Eu sou alguém que ele ajudou e... é uma longa história.
- Ah tá. Eu só queria saber se eu posso passar umas semaninhas aí.
- Acho que pode. Se quiser vir pra cá agora, pode vir.
- Ok então. Obrigada.
- De nadaaa! Um beijo.
Alguns minutos depois, Rachel chegou em minha casa. Marianne abriu a porta e recebeu-a muito bem, com alguns chocolates e um chá que ela havia preparado. Ela era muito prestativa.
- Então você é a Rachel... muito prazer!
- Você deve ser a Marianne. Mas me conte, você é namorada do meu tio?
- Na verdade não. Seu tio é uma pessoa muito boa e ele me ajudou muito no sábado. É uma looooonga história, talvez ele escreva algo sobre isso, haha.
- Ah, é bem provável. Ele é um gênio, o meu tio. Se eu disser que rosas são azuis, ele já escreve um puta texto, quem sabe até um livro!
- É mesmo? Bom, eu não tenho nem como imaginar, eu mal conheço ele. Mas percebi que ele é uma ótima pessoa.
- Sim, e como é. Ele é formado em Letras e em Psicologia. Ele gosta de me ajudar com os problemas que tenho com a minha mãe, a irmã dele. Ele a conhece desde que nasceu, então pode me dar dicas de como sobreviver à ela. Se não fosse por ele, acho que eu já estaria vagando por aí na rua, brincando de ser mendiga.
- Pois bem... foi meio nesse contexto que seu tio me ajudou. Eu estava na rua, jogada no chão, inconsciente e ferida. Eu só estou aqui na casa dele porque não tenho pra onde ir. Na verdade tenho a casa da minha mãe, mas lá é o último lugar pra onde quero ir.
- Estamos no mesmo barco então?
- Certo que sim. Mas acho que o seu problema tem cura. Você é filha única?
- Sou sim. É meio chato isso, sinto que nunca vou poder abandoná-la, mesmo brigando muito com ela.
- É, deve ser bem chato. E seu pai?
- Não conheço ele. Na verdade conheço, mas não me lembro. Minha mãe se separou dele quando eu tinha 4 anos e, desde então, ele nunca mais me procurou. Ela se casou com um chato quando eu tinha 8 anos e, ah, ela se tornou mais chata ainda ao lado dele.
- Compreendo. No meu caso, eu era muito amiga do meu pai, mas ele morreu. E o chato da história é o meu irmão mais velho.
- Nossa... você parece mais triste do que eu.
- Hahaha, vejamos... nada é tão triste como parece. Encontrei seu tio. Talvez esse seja o destino dele. Viver com meninas que sofrem com a perda de um pai e sofrem mais ainda com a presença de uma mãe que quer o bem delas, mas de uma maneira que elas não conseguem entender.
Cheguei em casa e vi as duas conversando demais. Tive medo de Marianne corromper minha sobrinha, sabe, psicológicamente falando, porém vi que elas estavam entretidas uma com a outra, contando suas experiências de vida. Elas dividiram o quarto e riram bastante, viram em cada uma uma nova amiga, talvez a amiga que sempre quiseram ter e a vida nunca havia lhes dado. Elas se entenderam e se completaram.
Logo que Rachel foi dormir, Marianne saiu do quarto (para comer seu mel e fumar o último cigarro antes de dormir). Ela se deparou comigo, sentado na janela, revisando um artigo que havia escrito e fumando. Sentou-se ao meu lado.
- Tudo bom?
- Tudo sim.
- Sua sobrinha é um amor. Ela tem 15 anos. Somos muito parecidas.
- Eu sabia que vocês se entenderiam. Amanhã Ana vem.
- Pois é. Que horas ela chega?
- Lá pelas 9. Pode acordar mais tarde dessa vez.
- Obrigada. Falou de mim para seus superiores? haha
- Falei sim. Eles disseram que você precisa me mandar seu currículum e depois a chamarão. Pode me fazer este favor?
- Claro que sim!
- Pode usar o computador do meu escritório. A impressora é a laser e a impressão fica melhor.
- Ok. Ah, vou dormir. Boa noite.
- Boa noite.
Fiquei mais um tempo lendo meu artigo e olhando para as estrelas. Quando entrei no quarto, tinha uma surpresa.
- Marianne?
- Err... Oi Carlos. Desculpa entrar aqui no seu quarto, é que a Rachel está dormindo na minha cama e...
- Não precisa me dar desculpas. O colchão está atrás do meu guarda-roupa.
- Bem, não era bem isso o que eu queria...
Ela se aproximou de mim e me beijou com tal brutalidade que cambaleei. Eu tentava me afastar mas ela se aproximava cada vez mais. Eu tentava me explicar mas minhas palavras eram vãs. Marianne estava em chamas e, por mais que eu fingisse que não queria, eu tive que confessar: ela era o meu maior desejo nesses últimos dias. Não podia resistir.
Tirei sua roupa e vi novamente suas curvas. Tirei minha roupa e via um velho pervertido (em boa forma, podemos dizer) transando com uma moça que ele estava tentando ajudar. Marianne era linda. Tinha seios pequenos e deliciosos, seu corpo magro que, ao apertar contra meu corpo, mostrava de leve suas costelas. Seu sexo era excitante e eu queria ela para sempre. Há anos eu não me sentia como estava me sentido ao transar com ela. Era como se eu tivesse novamente 20 anos. Era como se eu quisesse gozar de minha juventude temporária apenas com ela. Era como se ela fosse a única mulher no mundo e eu me sentia feliz, inexplicavelmente feliz de tê-la comigo.