terça-feira, 16 de dezembro de 2014

Raíz de giz de cera.

Travei. Desliguei o carro no meio da estrada. Aquele sonho era uma bad vibe, mas eu não sei porquê eu sempre o sonhava. Acordei. Olhei para os lados, ninguém, a bagunça do meu quarto dizia que eu deveria agir melhor comigo mesma e com as pessoas ao meu redor. Respirei, eu estava apenas de calcinha, o ventilador me dava frio, a janela não trazia sol. Sempre abro a mesma janela todo o santo dia, hoje com os peitos de fora, sem importar-me se os vizinhos iam ver (nunca tem ninguém nessa rua, mesmo).
Por que diabos ela ainda me procura? Não estou reclamando, apenas não vejo sentido. Eu não ofereço nada demais a ela ou a ninguém nesse mundo. Só uns pedaços de bolo e, quiçá, uns textos que costumo escrever. Parece que nada vai dar certo hoje.
Sonhar com carro significa autocontrole, minha amiga sempre me diz isso. Ela viu em minha mão uma linha que diz que eu posso ver o místico, grande coisa! Eu não preciso ver o místico, eu preciso que o místico me veja. Eu conheço o sonho e o sonho me conhece, é sobre isso que as coisas falam, é sobre isso que o Jim Morrison falava (quem sou eu pra discordar?), é sobre isso que o mundo é. Rasgar a cortina do real, sei lá, alguém me falava sobre isso ontem. Geralmente as coisas fazem sentido, mas ontem eu não entendia nada.

A felicidade dura pouco. Travei. Liguei o carro, que estava há alguns minutos parado na estrada. Morrer e aquelas viagens de DMT: ah, eu nunca estou sozinha.

segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Roseira de ventos

Eu sou uma grande bagunça. Vivo explosões e implosões de sentimentos. É como se eu tivesse meia dúzia de filhos da mesma idade que querem fazer de mim uma mãe louca. É como se todos os filmes não fizessem sentido. É como se o fim fosse o começo.
E é. Às vezes penso que um ciclo termina para que outro comece. Ando em círculos há vinte anos, mas é um sistema de roldanas: algumas rodas giram mais rápido, outras giram mais brandas, outras são menores, outras são maiores. Porém sempre giram, sempre lá, esperando que algo aconteça para que parem de girar. Esperando que apertem um botão para que parem de funcionar. Elas todas esperam o sistema falhar.
Eu sou uma grande estrada. Pareço infinita, porém sim tenho um fim. Pareço perdida, porém sempre chego a algum lugar.
Toda noite nublada tem estrela. Todo céu cinza é azul por dentro. Toda noite aluada tem sol detrás.


Eu.
Apenas.
Observo.
Apenas.
Para parecer que ainda vivo.

Eu não sei apontar para o norte.

domingo, 25 de maio de 2014

Estado Vago

Teu querer é um enorme vazio, um grande peso a carregar
É um acalento de devoção e desespero
Uma grande chuva que cai e aperta e molha
O meu bem estar.
A solidão é um estado eterno
Que carrego com um pouco de amar e de sofrer
Mas estar ao teu lado é um estado que não quero
Pois me mata e me come
Como um verme
Que deteriora minha alma-cadáver
Sujeito errante nesse espaço solar.
Ah, deixa eu te falar
Que nada sei, e não saberei até a verdadeira morte chegar
Deixa-me viver assim tão vaga

Que eu te deixo pensar que estou a errar.

sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

A vida e a morte revisitadas.

Esquecidamente, existi no sofá. Meu melhor amigo era um não tão moderno micro-ondas que tem, em seu teto, uma cafeteira acoplada. Nela, os barulhos mais estranhos – os quais já estou acostumada – se fazem ao gerar os grãos moídos e torrados em saboroso líquido negro. Jazi com as pernas para cima e os cabelos arrastando pelo chão, os olhos fechados – eu era mesmo morta – e no punho direito um relógio. Eu era morta-viva de mim mesma nestes nostálgicos dias de chuva. Tão morta que nenhum espírito me observava do corredor ou da abertura que dava para a cozinha. Tão viva que as mãos dançavam em volta de minhas pernas tentando imaginar prazer. Mas o contato com as outras pessoas do mundo era tão pouco que os dedos esqueciam o sorriso escondido dentro do suor dos lábios.
Eu tinha muitos livros: acabava e recomeçava, alguns ficavam pelo caminho, outros, de tão nauseantes, tapavam as goteiras de minha casa – que a cada dia que passa, multiplicam-se – e serviam apenas para não incomodar mamãe na hora do jantar. Minha solidão é tão vasta que me faz esquecer que tenho companhia por aqui. Solidão, vasta solidão, se eu me chamasse Raimunda não seria rima, tampouco solução. Não obstante, meu favorito era Rayuela, logo depois, uma grande saga que tomou meu coração e meus dias de pré-adolescência.
As memórias consumiam minha alma até o buraco mais profundo e eu adiava todos os acontecimentos para as datas mais distantes possíveis (mesmo quando se tratava de meu aniversário). Não há o que comemorar quando se está morrendo. A vida havia me deixado de lado, e eu nada mais podia fazer senão deixá-la de lado também. Era todo meu eu buscando sentido há tempos, mas tudo o que encontrou foi sentido nenhum. Eu virei pedra em jogo de amarelinha. Eu tirei todo o álcool do gim e nada restou. Minhas mãos tremem e eu não posso conter meu Parkinson temporário. Por fim, sumi.

Reexisti, pacificamente, no sofá. Minha cama já não me aceitava mais e meu melhor amigo era um bule com muito café dentro. Todas as fumaças esverdeadas e a poeira cristalina e refinada foram vendidas. Meu século é passado, mas coexisto em harmonia, assim como toda a história antes de mim. Meu sobrenome carrega desgraça, e eu carrego poesia.